Reforma do Código Civil propõe mudanças no casamento, divórcio e conceito de família 

Créditos:  Pixabay 

Está em curso no Congresso Nacional uma proposta de reforma do Código Civil brasileiro que promete alterar significativamente as regras que regem o casamento, o divórcio, a união estável, o conceito de família e o direito sucessório. O Projeto de Lei nº 4/2025, redigido por uma comissão de juristas, propõe ajustes que refletem as transformações sociais ocorridas nas últimas décadas e buscam adaptar a legislação à realidade contemporânea.

Entre os pontos de maior destaque estão a possibilidade de divórcio unilateral realizado em cartório, a substituição do termo “solteiro” por uma terminologia mais neutra, o reconhecimento legal de novas formas de arranjos familiares e a revisão do papel do cônjuge no direito das sucessões. Ainda que se trate, por ora, de uma proposta legislativa em análise, o debate já mobiliza juristas, instituições e a sociedade civil, devido aos seus potenciais impactos práticos e simbólicos.


Casamento entre pessoas do mesmo sexo

Desde 2011, o Supremo Tribunal Federal reconhece a união estável entre pessoas do mesmo sexo, e desde 2013 o Conselho Nacional de Justiça determinou que cartórios não podem recusar o casamento civil entre casais homoafetivos. A reforma do Código Civil propõe, agora, a positivação dessa garantia, incluindo expressamente o casamento homoafetivo no texto legal.

Embora, na prática, o direito já esteja consolidado por decisões judiciais, a inserção no Código Civil tem valor simbólico e jurídico importante, pois elimina margens para interpretações dúbias e afirma, em caráter definitivo, a igualdade de direitos civis entre casais hetero e homoafetivos.


Divórcio unilateral em cartório

Uma das mudanças mais debatidas é a que prevê a possibilidade de divórcio extrajudicial por iniciativa de apenas um dos cônjuges, mesmo sem o consentimento do outro. Atualmente, o divórcio em cartório exige acordo entre as partes e inexistência de filhos menores ou incapazes. Na ausência de consenso, o caminho obrigatório é o judicial.

A proposta permitiria que um dos cônjuges solicitasse o divórcio diretamente no cartório, mesmo sem a anuência do outro, utilizando, em último caso, notificação por edital. A medida visa desburocratizar o procedimento e garantir autonomia individual, mas também levanta questionamentos quanto à segurança jurídica, especialmente nos casos em que o cônjuge ausente esteja em situação de vulnerabilidade ou sem acesso à informação sobre o processo.

 

Alteração do estado civil: fim do “solteiro”

Outra proposta da reforma é substituir a designação “solteiro” por expressões como “sem vínculo conjugal atual” ou “não casado”. A justificativa é que a nomenclatura atual carrega conotações socioculturais que nem sempre condizem com a realidade afetiva ou familiar do indivíduo.

Embora pareça uma mudança apenas terminológica, ela reflete uma tentativa de modernizar o tratamento jurídico das relações civis e de reconhecer a multiplicidade de formas de organização familiar existentes na sociedade brasileira atual.


União estável e casamento: equiparação de direitos

A reforma pretende estabelecer equivalência plena entre a união estável e o casamento em todas as esferas legais. Na prática, isso significa que casais que convivem de forma duradoura, pública e contínua, mesmo sem casamento formalizado, passarão a ter os mesmos direitos e deveres, tanto patrimoniais quanto sucessórios.

Tal mudança traz segurança jurídica para milhões de brasileiros que vivem em união estável, mas também exige maior atenção quanto à formalização de regimes de bens, direitos hereditários e eventuais dissoluções da convivência, já que a lei passaria a tratar essas uniões com os mesmos rigores do casamento.


Reconhecimento de novos arranjos familiares

A proposta de reforma amplia o conceito de família ao reconhecer a chamada “família parental”, formada por ascendentes e descendentes (como avós e netos) ou parentes colaterais (como irmãos e primos) que compartilham vida em comum. Essa redefinição busca dar respaldo jurídico a vínculos afetivos reais, que muitas vezes não se enquadram nos modelos tradicionais, mas exercem as mesmas funções de cuidado, sustento e convivência.

Esse reconhecimento pode gerar efeitos concretos, como direitos à herança, à pensão, à inclusão em planos de saúde e à tomada de decisões médicas em nome do outro, especialmente em contextos em que não há vínculo conjugal ou parental direto.


Mudanças no direito sucessório

Um dos pontos mais sensíveis da proposta é a revisão do papel do cônjuge como herdeiro necessário. Atualmente, o cônjuge concorre com filhos e pais na divisão da herança. A nova redação sugere que o cônjuge somente teria direito à herança se não houver descendentes ou ascendentes vivos.

Essa modificação exige atenção especial de casais que desejam preservar direitos patrimoniais mútuos, sendo recomendável, em muitos casos, o uso de instrumentos como testamentos e pactos antenupciais, a fim de evitar conflitos e garantir a proteção recíproca dos parceiros.


A proposta de reforma do Código Civil marca um esforço relevante para atualizar a legislação brasileira às transformações sociais das últimas décadas. Em um país cada vez mais diverso em suas formas de organização afetiva, é necessário que a lei reflita essas mudanças, garantindo direitos, protegendo vulnerabilidades e promovendo segurança jurídica. Contudo, como toda mudança legislativa de grande porte, as alterações propostas exigem debate público qualificado e amplo diálogo com a sociedade. Trata-se de um tema que afeta diretamente a vida privada de milhões de brasileiros, e cuja implementação, se confirmada, demandará não apenas ajustes legais, mas também um esforço coletivo de compreensão e adaptação.


Neste momento, mais do que nunca, informação clara e orientação jurídica adequada serão fundamentais para que a cidadania seja plenamente exercida e os direitos familiares sejam preservados em sua plenitude.

Texto:

Patrícia Steffanello

Assessoria

Você também pode se interessar

26 de novembro de 2025
A Emenda Constitucional 136 altera as regras de pagamento de precatórios. União poderá pagar fora do teto a partir de 2026, enquanto estados e municípios enfrentam limites mais rígidos. Veja impactos, prazos e novas correções.
26 de novembro de 2025
INSS passa a exigir biometria para novos benefícios a partir de 21/11. Veja quem precisa fazer, quem está dispensado, documentos aceitos, etapas de implantação até 2028 e como a medida busca reduzir fraudes.
26 de novembro de 2025
Pensão para órfãos de feminicídio começa a valer em dezembro. Benefício garante um salário mínimo mensal para crianças e adolescentes com renda limitada. Saiba quem tem direito, documentos aceitos e como solicitar pelo INSS.